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O Ouro da Mata Mineira
postado por em: 15/10/2009 16:13

O século XIX foi dedicado a grandes transformações, principalmente no que diz respeito ao transporte de pessoas e cargas, graças à invenção da ferrovia, na Inglaterra.

Em nosso país tudo começou com o Barão de Mauá, grande empresário que constituiu a Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis, colocando o Brasil nos trilhos, literalmente. Em virtude da escassez do ouro e da alta rentabilidade da produção cafeeira, os produtores da zona da mata mineira fundaram a Companhia Estrada de Ferro Leopoldina com o objetivo de interligar Leopoldina à nossa cidade, pois aqui, desde 1871, era a estação terminal da Estrada de Ferro D. Pedro II, importante meio de ligação do interior ao porto da cidade do Rio de Janeiro. Mais tarde, com a Proclamação da República, a referida companhia passou a chamar-se de Estrada de Ferro Central do Brasil.

A primeira estação e trecho inicial da Estrada de Ferro Leopoldina foi inaugurada em 08 de outubro de 1874¹ pelo Imperador D. Pedro II, um dos grandes incentivadores das artes, cultura e do progresso em nosso país. Foi uma presença memorável, frente ao enorme potencial que a referida estrada de ferro teria anos à frente. A companhia, porém, teve vida curta. Consumida por dívidas, ramais pouco rentáveis e acidentes, passou a ser administrada por credores ingleses e adotou um novo nome: The Leopoldina Railway Company Ltd. ². A partir de então, foi ampliado seu traçado, promovida a encampação de pequenas ferrovias e a construção da Estação de Barão de Mauá na cidade do Rio de Janeiro, um marco na arquitetura e desenvolvimento. Seus trilhos se estenderam pelos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo, formando uma das mais importantes malhas ferroviárias do sudeste.

Podemos afirmar que tudo começou em Além Paraíba, na pequena estação de São José, berço da Estrada de Ferro Leopoldina, e que hoje abriga documentos que contam um importante período da história ferroviária do Brasil.

É importante destacar que a ferrovia foi a mola mestre do progresso de nossa cidade, pois através do trem tudo chegava e partia. Movimentou e ainda hoje é uma das grandes responsáveis pela economia com seus inúmeros aposentados.

Todos lembram que os ferroviários eram ativos participantes da vida social e política de nossa cidade. Através do Sindicato dos Trabalhadores fizeram manifestações, greves e impediram o tráfego entre o Rio de Janeiro e as cidades da região, objetivando alcançar melhores condições de vida. Muitos foram perseguidos pela ditadura militar, alguns presos e torturados, outros mortos (até mesmo seus familiares) em nome de um ideal maior.

Pode-se dizer que não eram empregados, mas uma família. No auge, as mais de mil pessoas que trabalhavam na oficina não construíam apenas carros de passageiros e reparavam locomotivas, mas participaram de times de futebol (BAYNE Futebol Clube, CIAPE, Independente, Santa Maria), clube de serviço (Minas Clube) e tinha sua própria escola (Liceu Operário). Até mesmo um artista saiu daquela oficina: José Heitor.

Ajustador mecânico, que entre outras peças, retratou, em madeira, o busto do presidente João Goulart, recebeu a escultura das mãos de Demisthóclides Baptista (o Batistinha) e Herval Aroeira, ambos do sindicato no Rio de Janeiro. Após essa obra de repercussão, o artista, em 1966, produziu a obra Simpatia Carrancuda, que veio a ser destaque da Escola de Samba vem Amor, e após isso, a convite de Abdias Nascimento, a obra passou a compor o acervo do Museu de Arte Negra do Rio de Janeiro. “A obra foi enviada pelo trem noturno, trem esse da Estrada de Ferro Leopoldina, partindo de Além Paraíba para Porto Novo em direção a um novo porto e outros mares”.³ O artista continua a produzir peças em madeira, cujo trabalho foi iniciado retratando colegas de turma com o barro do tanque da locomotiva a vapor. Secando esse barro ele modelava o rosto de seus colegas de turma no horário de almoço.

Em 1957 a Estrada de Ferro Leopoldina passou a fazer parte da recém criada Rede Ferroviária Federal S/A que sobreviveu até sua extinção, ocorrida em 2007. Seu importante patrimônio ferroviário precisa ser recuperado e cuidado. A ação do tempo e o descaso dos governantes fizeram com que aos poucos isso tudo fosse perdendo seu encanto. Já foi vítima, inclusive, de especulação imobiliária, além de inúmeras goteiras, incêndios, cupins e poeira.

Mas o que fazer frente a isso? Podemos ficar calados e ver o trem da história passar? Ver a ação do tempo em um dos mais importantes patrimônios de nossa história? Acredito sinceramente que não.

Além Paraíba deve planejar seu desenvolvimento sem se esquecer do patrimônio ferroviário localizado em locais nobres (Porto Novo, Vila Laroca e São José) – isso não significa, tão-somente, manter de pé prédios antigos, mas aproveitá-los da melhor maneira. É preciso repensar a utilidade daqueles imóveis com os olhos no futuro, de modo a atender o bem-comum.

Atualmente parte deles é utilizada por museus, cineclube, arquivo histórico, telecentro, bibliotecas e até mesmo uma casa de cultura com algumas secretarias da Prefeitura. A população precisa conhecer esses espaços e utilizá-los, sem deixar de dar sugestões para seu melhor aproveitamento. Se não puder visitá-los pessoalmente, consulte a web site: http://www.museuhcnaturais.org.br. As escolas precisam levar seus alunos para conhecer estes locais, pois neles existem muitas exposições e atividades que podem colaborar com o currículo dos alunos de nossa cidade.
Em 08 de outubro de 2009 comemoramos 135 anos de fundação da Estrada de Ferro Leopoldina. Esperamos que a sociedade alemparaibana e o poder público possam resgatar a memória histórica desse imponente patrimônio e não apenas olhar para a estação de São José como um mero prédio antigo da estação ferroviária, mas que seja possível compreender que em Além Paraíba foi criada uma das mais importantes estradas de ferro.

1 - RODRIGUEZ, Helio Suêvo, A Formação das Estrada de Ferro no Rio de Janeiro, 2004, p. 126
2 - RODRIGUEZ, Helio Suêvo, A Formação das Estrada de Ferro no Rio de Janeiro, 2004, p. 126
3 - SILVA, José Heitor, Jornada de um homem simples, pg. 42

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